O vereador Lídio Melado (PTB) foi indiciado pela Polícia Federal no relatório final da operação Laranja Mecânica, que investigou e apurou irregularidades no transporte escolar em Sant’Ana do Livramento. A informação foi confirmada na tarde deste sábado (22). No documento, que deve ser encaminhado pela Polícia Federal à Justiça Federal e ao Ministério Público Federal apontou a existência de uma organização criminosa constituída especialmente para lesar os cofres públicos e, consequentemente, a comunidade destinatária dos serviços públicos de transporte escolar.
Além da falta de transparência nos processos licitatórios, identificou-se que as empresas vencedoras dos certames, destinatárias de valores vultosos, eram, em sua maioria, despidas de estrutura compatível, muito aquém do perfil esperado de uma instituição que celebra contratos com a Administração Pública.
Empresas e sócios possuiam endereços idênticos, inclusive entre donos de empresas que, teoricamente, deviam ser concorrentes. Veículos de empresas prestadora eram estacionados na sede de empresa concorrente. Algumas empresas licitantes sequer teriam veículos para prestação dos serviços.
Ao todo, foram investigadas 16 empresas e indiciadas 23 pessoas, pela prática de crimes de fraude à licitação, estelionato, corrupção e organização criminosa.
CONTRAPONTO
Procurado pelo Jornal A Plateia, o vereador Lídio Mendes disse que os seus advogados estão analisando o documento e que ele aguarda a manifestação do Ministério Público Federal para saber se “o MPF vai aceitar, ou não”.
RELEMBRE O CASO
Nas primeiras horas da madrugada de 21 de novembro de 2017, a Polícia Federal, com apoio da Controladoria Geral da União (CGU), deflagrou a Operação Laranja Mecânica, para desarticular a fraude a licitações para obtenção de contratos públicos de prestação de serviços de transporte escolar. Entre os detidos, o vereador Lídio Mendes, o Melado, do PTB, suspeito de participação em esquema.
Cerca de 150 policiais federais e seis auditores da CGU cumpriram 36 mandados de busca e apreensão, cinco de prisão temporária e quatro ordens judiciais de afastamento da função pública nas cidades de Sant’Ana do Livramento, Dom Pedrito, Rosário do Sul, São Gabriel, Alegrete e Uruguaiana.
Os detidos deram depoimento às autoridades policiais na sede da Polícia Federal de Livramento, sendo, posteriormente, conduzidos ao presídio local, cumprindo prisão temporária.
As investigações iniciaram em setembro de 2016, e pouco mais de um ano após seu começo, no dia 3 de outubro, o funcionário público Júlio César Doze, então servidor da Secretaria de Educação e responsável pela Fiscalização dos serviços de transporte escolar no município, denunciou irregularidades nesse serviço. Munido de vasta documentação, ele prestou depoimento de mais de quatro horas ao promotor de Justiça José Eduardo Gonçalves.
A denúncia feita pelo servidor teria apontado para a formação de um “lobby” dentro da política para interesses particulares, envolvendo as licitações do transporte escolar, além de supostas fraudes das licitações e serviços durante o ano.
Como funcionava o esquema, segundo a Polícia Federal
As investigações tiveram início em setembro de 2016 para apurar o conluio entre empresários com o objetivo de frustrar o caráter competitivo da licitação de transporte escolar nos municípios de Sant’Ana do Livramento e Dom Pedrito.
Acordos previamente estabelecidos definiam, segundo a Polícia Federal, quais as empresas ficariam responsáveis por determinadas “linhas”, de maneira que todas obtivessem contratos nesses municípios.
Além da fraude no processo licitatório, a investigação identificou casos em que os serviços previstos são executados fora dos padrões mínimos exigidos pela lei ou pelo edital, com veículos em condições precárias.
Foi apurado que, frequentemente, os serviços não eram prestados, embora atestados por diretores de algumas escolas em troca de caronas, viagens, festas e até mesmo pagamento em dinheiro.
Em Livramento, um vereador teria solicitado e recebido vantagem indevida de um empresário para interceder junto ao poder executivo municipal em procedimentos de fiscalização que a prestadora de serviço de transporte escolar vinha sofrendo. Os crimes apurados são fraude à licitação, estelionato, falsidade ideológica, corrupção ativa, organização criminosa e ameaça.
O valor pago pela prefeitura de Livramento à empresa prestadora de serviço de transporte escolar ultrapassou 5 milhões de reais, em 2016.
O que disse a equipe responsável sobre a Operação Laranja Mecânica
“Esse é um trabalho que deflagramos hoje em relação a fraudes no transporte escolar e que já vinham sendo noticiadas alguma irregularidades. Já vínhamos fazendo investigação e hoje a gente cumpriu algumas medidas cautelares relacionadas a essa investigação. Foram mandados de prisão temporária, mandados de busca e alguns afastamentos de função pública. Duas pessoas em Dom Pedrito e duas em Livramento. Iniciamos a investigação próximo ao final do ano passado e fomos aprofundando a investigação, sendo constatadas irregularidades no transporte. Identificamos, em um primeiro momento, a formação de cartel, empresas que se associavam para participar das licitações e que na verdade não havia licitação, e havia conluio entre as empresas, e também identificamos a criação de empresas fantasma com essa finalidade”.
Sobre as denúncias de Júlio César Doze
“Ele fez as denúncias e elas contribuíram muito para as investigações. Prosseguimos a investigação”.
Sobre o esquema de fraude
“Para se ter uma ideia dos números que envolvem o transporte escolar, só em Livramento, só em 2016, a Prefeitura empenhou cinco milhões de reais. Parte desse valor é devido e parte dele é fraudado por fraude que diz respeito à licitação, ou seja, não existe concorrência. As empresas simulam a concorrência e, além disso, existe fraude no que diz respeito a execução do serviço. As empresas não prestam o serviço, mas cobram como se tivessem feito, ou seja, rodam 200 ou 300 Km, lançam como se tivessem rodado, recebem pagamento nesse valor, mas na verdade isso não acontece”.